Cobrança indevida no condomínio: tudo que é demais está errado!

“Tudo que é demais está errado!” A frase é de Monteiro Lobato e está em “A reforma da natureza”. Lição óbvia, mas tantas e tantas vezes ignorada e, esse desprezo à evidência traz problemas. Dentre tantas e tantas situações, é o que se dá quando o condomínio cobra indevidamente o condômino, por algo já pago, indevido.  
 
Vamos lá: o condômino deve, isto está no artigo 1.336 do Código Civil, “contribuir para as despesas do condomínio”; este dever é tão sério que, atualmente, o Condomínio pode até mesmo “executar” o inadimplente. Lógico, sem as contribuições de todos nada funcionaria; sem a contribuição de alguns, os demais sustentariam os inadimplentes. 
 
E, deve o síndico, obedecendo ao disposto no artigo 1.348 do Código Civil, “cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas”. Enfim, o condômino deve contribuir, o condomínio – por meio do seu síndico – deve cobrar. Se todos pagarem, tudo estará bem; se alguém não pagar, será acionado, este é o tempero exato dessa relação. 
 
Mas, e se por qualquer motivo (e os caminhos das más práticas são incontáveis…), o condomínio cobrar mais do que tem o dever de ratear, ou cobrar pela segunda vez quem já houver contribuído?  Esse exagero, como adiantei, terá consequências ruins. 
 
Inicialmente, sofrerá aquele injustamente cobrado: a par do dano econômico poderá sofrer dano moral (a comunidade condominial é rápida no divulgar coisas ruins, mesmo que falsas); ajuizada ação, seu cadastro será automaticamente negativado; poderá, eventualmente, perder negócios. Porém, isso tudo ele deverá levar ao Judiciário, caso não completa e satisfatoriamente indenizado materialmente e reposta a sua condição moral pelo condomínio antes, a tempo.  
 
E, levando ao Judiciário a questão, o injustamente cobrado será ressarcido: novamente, está no Código Civil, artigo 940 (e cito os artigos em homenagem à precisão) a obrigação de: “Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.” Pronto! Caberá ao vitimado pelo excesso reclamar essa indenização. 
 
Casos assim se repetem. Pena que ocorram, bom que as vítimas sejam acolhidas e ressarcidas. O Judiciário está atento, como se vê nesta decisão relatada pelo Desembargador Paulo Ayrosa (TJSP-Apl. 10236737420158260100 SP): “… configura-se abusiva a conduta do condomínio em persistir na cobrança após o adimplemento do débito, razão por que deve restituir em dobro a quantia ilegalmente cobrada”.  

Outra decisão, assegurando ao vitimado receber em dobro e ter seu dano moral indenizado: “… comprovado erro injustificável do condomínio autor na cobrança da dívida sabidamente já paga, circunstância objeto de prévio aviso por parte do réu reconvinte. Sanção civil do art. 940, do CC plenamente justificada nas circunstâncias. Danos morais. Protesto indevido incontroverso. Caracterização in re ipsa de danos morais indenizáveis…”. (TJSP-Ac 10361453120168260114 SP, Relator Desembargador Airton Pinheiro de Castro). 
 
Portanto, caso o condomínio se exceda na cobrança, será responsabilizado. A lei comanda que haja justiça, a lembrar o cuidado com que agem, é certo, os bons síndicos e administradores. 

Por Jaques Bushatsky é advogado. Presidente da Comissão de Locação e Compartilhamento de Espaços do Ibradim – Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário. Fundador e diretor da MDDI – Mesa de Debates de Direito Imobiliário. Autor da obra “Aspectos Principais do Aluguel Comercial” e coautor da obra “Locação Ponto a Ponto”, publicada pelo IASP (Instituto dos Advogados de São Paulo). Pró-reitor da Universidade Corporativa Secovi-SP. Sócio da Advocacia Bushatsky.