O Brasil vive uma transformação demográfica profunda, marcada pela presença crescente da população idosa. Segundo estimativas do IBGE, o país já ultrapassa 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, sendo mais de 8 milhões no Estado de São Paulo e mais de 2 milhões na capital paulista. Essa parcela da população, conhecida como Geração Prateada, representa um grupo ativo, engajado e cada vez mais relevante do ponto de vista econômico, social e cultural. Essa dinâmica, frequentemente chamada de Revolução Prateada, evidencia que ser idoso vai muito além do que a legislação descreve, embora leis como o Estatuto da Pessoa Idosa, a Lei Brasileira de Inclusão e outros decretos federais sejam fundamentais para garantir direitos, autonomia e proteção.
De acordo com a Fundação Getúlio Vargas esta geração constitui “…uma faixa etária como um grupo com identidade própria, cada vez mais ativo, participativo e relevante do ponto de vista econômico, social e cultural… marcada por um perfil mais saudável, engajado e consumidor”.
Diante desse cenário, os condomínios — que concentram grande parte da vida urbana — têm
papel decisivo na promoção de qualidade de vida. Apenas na cidade de São Paulo são cerca de 32 mil condomínios, de acordo com o Mapa dos Condomínios da Data Lello, e aproximadamente 700 novos prédios surgem a cada ano. Entretanto, muitos desses edifícios foram construídos antes das exigências de acessibilidade, o que torna as reformas e adaptações um desafio constante. Mesmo assim, a legislação assegura o direito à acessibilidade e, em casos necessários, moradores podem recorrer à Justiça para garantir a execução das adaptações. Nos novos empreendimentos, por outro lado, a obrigatoriedade de cumprir às normas técnicas vigentes para todas as áreas comuns já é uma realidade consolidada.
A criação de um condomínio amigável para idosos exige planejamento cuidadoso, diagnóstico técnico e soluções personalizadas. Como define Aldo Dórea Mattos, “planejar uma obra grande ou uma pequena reforma segue o mesmo roteiro; o que muda é a escala”. Isso significa que as decisões devem ser tomadas com base em levantamento adequado das necessidades do condomínio, avaliação das condições reais de estrutura e consulta a profissionais especializados em acessibilidade. Quando não for possível tornar um espaço completamente acessível, é necessário apresentar justificativas técnicas devidamente registradas e validadas pelos órgãos públicos competentes.
As adaptações físicas são fundamentais para garantir autonomia e segurança. Entradas acessíveis, rampas com inclinação adequada, escadas com corrimãos duplos, sanitários adaptados, pisos antiderrapantes, calçadas regulares, sinalização visual e tátil, iluminação eficiente e vagas reservadas são elementos indispensáveis. A ergonomia e a segurança também precisam estar presentes no cotidiano, por meio de fechaduras eletrônicas, iluminação automática, sensores de fumaça, fogões por indução, mobiliário adequado e dispositivos de emergência em áreas como academias, piscinas e sanitários. Esses recursos beneficiam não apenas idosos, mas também crianças, gestantes, pessoas com mobilidade reduzida e qualquer pessoa com limitação temporária ou permanente.
Além das adaptações arquitetônicas, a oferta de serviços é uma forte aliada na construção de um ambiente acolhedor e funcional. A Geração Prateada valoriza autonomia, praticidade e bem-estar, e por isso espaços como coworkings, lavanderias compartilhadas, áreas de jardinagem, ambientes sensoriais, pistas de caminhada internas, pet places e espaços de convivência tornam-se diferenciais significativos. Parcerias com profissionais de saúde, academias, fisioterapeutas e empresas de atividades físicas ou culturais também reforçam a rede de apoio. Da mesma forma, o preparo da equipe do condomínio — do porteiro ao síndico — é essencial para criar uma cultura de atendimento acessível, respeitoso e livre de preconceitos.
Essa combinação de adaptações físicas, tecnológicas e sociais apresenta efeitos diretos na valorização imobiliária. Condomínios acessíveis podem atingir até 20% de valorização, além de reduzirem a vacância e atraírem um público que busca qualidade de vida, segurança e conveniência. Não é por acaso que modelos de empreendimentos como o Living Senior têm ganho espaço nas grandes cidades, projetados desde o início com desenho universal, sem a necessidade de adaptações posteriores. São construções pensadas para todos, independentemente de idade ou condição física.
Ainda assim, é fundamental ressaltar que a eliminação de barreiras arquitetônicas é apenas
parte do processo. É igualmente importante remover barreiras de atitude, como o etarismo,
preconceito relacionado à idade e ainda muito presente na sociedade. Normas, leis e decretos orientam, mas não esgotam o conjunto de atitudes e decisões necessárias. O verdadeiro desafio dos próximos anos está em enxergar além das exigências legais e compreender que a acessibilidade é um valor coletivo, que beneficia não só o presente, mas também o futuro de todos nós.
Construir um condomínio realmente amigável para idosos é unir legislação, técnica, sensibilidade e visão de futuro. É reconhecer a potência da longevidade e promover ambientes que acolham, respeitem e celebrem todas as fases da vida. É transformar moradias em espaços de convivência, segurança e dignidade. É, sobretudo, entender que uma sociedade acessível para idosos é uma sociedade melhor para todos.
*Por Ana Paula Capuano é arquiteta, especialista em acessibilidade, professora universitária e
mestre em Ciências Ambientais.

